Vira e mexe, a Academia resolve botar um filme "menor" para concorrer ao prêmio de Melhor Filme. Quando isso acontece, geralmente são filmes mais leves, que fisgam o espectador de algum modo, mas que não necessariamente têm cacife para levar a estatueta. Foi assim com Pequena Miss Sunshine (em 2007), Juno (em 2008) e Os Descendentes (2012). Esses filmes acabam ingressando na lista para dar mais "corpo" ao prêmio, pois mesmo fazendo sucesso em festivais de nome como o Sundance, acabam por perder para os filões mais "oscarizáveis" que a Academia tanto ama. Esse é o caso de Whiplash.
Dirigido pelo jovem (afinal, nasceu em 1985) Damien Chazelle, Whiplash é um orgasmo musical. A trama se passa no Conservatório Musical Schaffer em Nova Iorque, onde o regente Terence Fletcher (interpretado pelo sempre competente J.K. Simmons) trata os alunos do pior modo possível, ofendendo-os, agredindo-os fisicamente, tudo em nome de "ir além do limite". Fletcher é um professor (será?) irracional, que não tem escrúpulos em mudar os musicistas de sua banda de jazz como bem entende. Dentre os que sonham em fazer parte da banda, está Andrew Neyman (papel interpretado por Miles Teller, o futuro Sr. Fantástico no novo filme do Quarteto), um rapaz que anseia ser um grande baterista de jazz, mas que luta contra o preconceito de sua própria família. A vida de Andrew é dedicar horas e horas ao estudo de seu instrumento a fim de assegurar seu lugar na banda regida por Fletcher, mesmo que isso custe, literalmente, o seu sangue.
A história é simples, sim. É mais um filme em que acompanhamos a trajetória de um sonhador. E, pessoalmente, adoro filmes assim, "biográficos". Embora Andrew Neyman seja o protagonista principal, quem leva o filme pelas mãos é o ótimo J.K. Simmons, que recebeu o Globo de Ouro de Melhor Ator Coadjuvante merecidamente. Seu papel é muito delicado, interpretando um regente que é um verdadeiro cretino (pra não usar palavrões aqui no texto) e que não muda a sua natureza ao longo da projeção. No meu ponto de vista, não concordo com "professores" que se orgulham em ofender alunos, maltratando-os, chamando-os de burros ou incompetentes. Gente assim, pra mim, não serve para ensinar e jamais deveria ter o título de professor. Porém, dentro do contexto do filme, a figura de Fletcher serve para incentivar Neyman, fazendo-o descobrir que pode ir muito além de seus limites. E o desejo de ser o melhor acaba também atrapalhando sua vida pessoal, tornando Neyman um sujeito arrogante e solitário (seria essa uma metáfora romântica sobre o musicista de jazz?).
Contudo, o grande tesão do filme ainda é a sua trilha sonora. Somos embebidos em jazz. São minutos e mais minutos em que a música não para e nós, como espectadores, não desejamos que ela pare. Dá vontade de pegar alguma bebida e acompanhar a apresentação da banda de Fletcher. E tudo se torna ainda mais legal quando sabemos que o ator Miles Teller realmente se empenhou em tocar a bateria no filme. Poucos filmes me dão vontade de escutar sua trilha sonora ao final, mas no caso de Whiplash, estou redigindo essa impressão enquanto a ouço: é simplesmente magnífica!
Fugindo de um final politicamente correto, Whiplash dá uma pequena reviravolta em seu terceiro ato, o que nos traz um sorriso ao rosto, pois são detalhes assim que engrandecem uma obra. Com uma edição praticamente perfeita (afinal, somar vários takes de bateria não é para qualquer um), a obra de Damien Chazelle nos faz ficarmos mais atentos ao seu nome. Que venham ainda muitos filmes excelentes como esse, afinal, não é todo dia em que assistimos a um concerto de jazz na telona.
Alex Martire