Brazil, 1985.


Talvez Terry Gilliam não seja um diretor para todos. Seus filmes não são "comuns", isso é fato. Gilliam abusa (ainda bem) do humor e da fantasia para fazer seus filmes, mas sempre de um modo em que se tornem inteligentes: não é uma comédia feita apenas para rir, não é uma fantasia/aventura apenas para nos deslumbrarmos com o visual.

Que sou fã de Gilliam, não escondo. Ele é um dos poucos diretores que casam perfeitamente com meu gosto por "estranhices", tornando o bizarro em interessante. Já havia visto "Brazil" em DVD há um tempo, mas revi agora em Blu-ray, e em Director's Cut, o que só fez aumentar meu fascínio pela obra! Novamente tenho de me repetir com relação ao meu gosto por efeitos que independem de computação gráfica: como gostaria de ver um filme hoje em dia usar basicamente apenas miniaturas, bonecos, essas coisas "falsas"! Sinto falta disso: no mundo digital as texturas são...digitais, claro: falta um "tempero", falta uma sensação de realidade, algo com que a gente olhe e pense "Isso eu posso tocar". É claro que o uso de coisas reais pode trazer a clara ideia de que tudo é uma farsa mas, como disse o mestre Harryhausen em um documentário, "a graça da fantasia é saber que ela é irreal". Vendo em blu-ray essa "farsa" fica ainda mais escandalosa: e o Gilliam não quis sequer apagar os cabos que sustentam Sam Lowry quando ele voa igual Ícaro - estão ali, e permanecerão, já que o diretor parece respeitar o fato de que, uma vez que chega aos cinemas, o filme deixa de pertencer a seu criador e se torna um bem daqueles que o assistem. Os efeitos na época em que foi lançado (1985) já eram ótimos e ainda hoje impressiona pensar no tempo que gastaram produzindo-os. Um deleite!

A história do filme pode ficar um pouco confusa no decorrer de seus 142 minutos mas, o cerne, é: em algum momento  do século 20 uma cidade (ou um país, ou um mundo) está infestada de burocratas. É necessário preencher centenas de formulários e requerimentos para fazer coisas cotidianas, tal como arrumar a refrigeração de seu apartamento. Somos apresentados à personagem central da trama, Sam Lowry, um rapaz que exerce tediosamente sua função no Departamento de Arquivos do Ministério de Informações, passando os dias preenchendo papéis. Sua vida muda quando, impulsionado por sonhos, é atraído pela figura da "terrorista" Jill Layton - uma mulher que testemunhou um erro do ministério e agora é perseguida para queima de arquivo. Sam Lowry é promovido para o departamento de Obtenção de Informação, no qual vai desvendando aos poucos a vida de Jill ao mesmo tempo em que se afunda em problemas burocráticos. 

E sobra sarcasmo de Terry Gilliam para tratar da Burocracia! Ele é ácido, realmente genial em fazer com que pensemos: "Mas que porcaria, é isso mesmo o que acontece! É por isso que o país sempre emperra". Não fui atrás de mais informações sobre a visão do próprio Gilliam sobre esse filme, mas talvez tenha de discordar de uma crítica que li há um tempo e dizia que, de Brasil, havia só o título. Acho muito difícil Gilliam ter dado o nome ao filme à toa, só por causa da música "Aquarela do Brasil" que é tocada sempre. Sendo ele bem esperto, creio que tenha sobrado, sim, uma ponta de crítica ao nosso país: o Brasil é, reconhecidamente, um país que sofre do mal burocrático, temos muita gente que tem o mesmo destino de Gregor Samsa do Kafka. Tudo aqui para na burocracia e é mais fácil mover o mundo no sentido contrário do que conseguir que seus problemas se resolvam de forma prática. Obviamente, "Brazil" é uma fábula que se aplica à qualquer nação, mas, que a gente ri de indignação ao fazer analogia com nosso cotidiano brasileiro, a gente ri!

Também faço parte do coro daqueles que clamam ser "Brazil" a obra-prima de Terry Gilliam. Pra mim, ela ganha por pouco do "Mundo Imaginário do Dr. Parnassus" (2009). É como eu disse: não é um filme para todos. Mas aqueles que gostam de sarcasmo e fantasia irão se deliciar ao som da "Aquarela"!

Alex Martire


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