O Hobbit - Uma Jornada Inesperada, 2012.


Eis que chega aos cinemas o último grande lançamento de 2012 ("último" no sentido blockbuster, pois ainda falta As Aventuras de Pi e A Viagem - postergada para o início de janeiro aqui no Brasil). O Hobbit chega com status de gigante, em todos os sentidos: sendo exibido em salas gigantes, tendo público gigante e tendo duração gigante.

Antes de mais nada, devo confessar que sou muito apaixonado pela obra do Tolkien e já a reli várias vezes. Também adorei a trilogia do Senhor dos Anéis e a vi diversas vezes no cinema e tenho todas as edições lançadas em DVD e Blu-ray. Sou fã. Mas nem por isso fico cego aos problemas existentes tanto na trilogia antiga como nesse filme novo. É normal que existam problemas em filmes de grande porte e que envolvam somas astronômicas de dinheiro: isso deve ser relevado. O primeiro filme do Senhor dos Anéis tem um aspecto que sempre me incomodou, a edição: são cortes muito secos e não dá a mínima noção do quanto tempo que a irmandade ficou viajante pela Terra-Média. Felizmente, em O Hobbit não há esse deslize e tudo leva o seu tempo. Talvez tempo até demais.

A nova obra de Peter Jackson é um filme bom, que vale o ingresso. Mas fica por aí. Não adianta todo esse frenesi sobre o filme, com muita gente (ou fã fanático) dizendo que é um dos melhores filmes do ano. Não é. Está longe de ser e, infelizmente arrisco dizer, nem a trilogia, quando completada, será um marco no Cinema como foi O Senhor dos Anéis. Um dos principais problemas de O Hobbit está naquilo que, talvez para a maioria das pessoas, seja o seu grande mérito: a literalidade. É tudo muito literal, tudo muito baseado no livro - embora com algumas coisas a mais aqui e acolá. No geral, me pergunto: vale a pena fazer um filme que é quase uma transcrição do livro? Praticamente o tempo que você gasta lendo os 6 primeiros capítulos do livro equivale à duração do filme. O Hobbit, então, é um "livro em movimento". Muito bonito visualmente, muito longo cinematograficamente. Não chega a ser extremamente cansativo de assistir, pois prende a atenção, mas há muitos momentos que poderiam ser deixados de fora, pra tornar a narrativa mais fluida. Tirasse meia hora de filme, seria uma obra bem mais agradável.

Começa com a opção de Peter Jackson em conectar a trilogia antiga com essa nova. Desnecessário, mas é uma opção do diretor. Assim sendo, somos apresentados ao Bilbo velho um pouco antes da festa em que acontece seu sumiço na Sociedade do Anel. Nesses primeiros minutos (que poderiam ser mais curtos) Bilbo conta a história de como Smaug destruiu a antiga Erebor e afugentou os anões da Montanha. Tudo muito bonito e que ganha uma dimensão incrível quando visto em IMAX: achei ótima a reconstituição da cidade dos anões, embora no livro sempre apareça bem mais simples.Tendo narrado o prólogo, Bilbo começa a lembrar o seu primeiro encontro com Gandalf e é assim que o filme, de fato, começa. Há o famoso diálogo do "bom dia" entre o mago e o Bilbo de 60 anos atrás e isso é legal de ver na tela. Também é legal ver a chegada dos anões, embora eles tenham ficado mais parecidos com homens do que com o próprio povo: Thorin Escudo-de-Carvalho, por exemplo, em nada lembra um anão - está mais para a versão Aragorn em O Hobbit. E é aí que começam, pra mim, os grandes problemas no filme.

Quem viveu no planeta terra nos últimos 10 anos assistiu ao primeiro filme da trilogia d'O Senhor dos Anéis. E quem vai ao cinema assistir ao Hobbit, verá o mesmo filme! Incrível como Peter Jackson não teve vergonha na cara e usou a mesma estrutura narrativa do SdA nesse filme, incluindo tomadas idênticas. Sabe aquela batalha do começo do SdA entre elfos, homens e o exército de Sauron? Pois é, a batalha em Erebor no começo do filme é igual, com o voice over. Lembra de Moria, com a Sociedade fugindo pelos corredores e escadarias? É a fuga dos anões e Gandalf pelas Montanhas Sombrias. E quando Gandalf fica preso na torre de Saruman e conversa com a mariposa? Mesmo tendo essa cena no livro do hobbit, ela é filmada exatamente igual a dez anos atrás! Aquele esquema Condado-Floresta-Valfenda-Montanha com Orcs-Ermos se mantém também: não seria problema, pois no livro é assim, mas o desenvolvimento das cenas é praticamente igual ao de SdA. Ou seja: inovação narrativa não foi o que Peter Jackson quis. Uma pena... As vozes dos trolls e do Grão-Orc também são um problema sério, a meu ver: em nada lembram monstros: parecem apenas com homens normais. Vou pular comentários desnecessários sobre a inutilidade da figura de Radagast  e falar sobre aquilo que realmente me incomodou em O Hobbit: ele é sério demais. Tirando uma piadinha aqui e outra acolá, o tom do filme é muito pesado. Aposto que você, ao ler O Hobbit pela primeira vez, se divertiu com o livro escrito para crianças: é uma leitura agradável, leve, fluida, até mesmo bobinha - é um livro para se divertir sem maiores preocupações. Pois bem, Peter Jackson deixou isso de lado e apresenta um filme épico que, ao tentar tornar uma história simples em algo grandioso e sério, descaracterizou a obra que ele tanto quis filmar ao pé da letra. Deu um tiro no pé. Quer uma prova enorme sobre isso? Os animais não falam no filme! Muitos podem dizer "Ah, mas animais falantes, como no livro, vai tirar o tom realista da obra". E eu respondo: magos, elfos, anões, hobbits e anéis mágicos são realistas pra caramba, né?! O Senhor das Águias não fala nada (nem dá um pio, literalmente), e isso pode já revelar algo que acontecerá no desfecho do terceiro filme (ou no segundo, dependendo do teste de paciência que Jackson quiser infligir em seu público): o tordo que conta ao pé do ouvido de Bard como matar Smaug provavelmente não existirá. Até os wargs, que têm voz no livro, não falam nada no filme. Ah, é: isso se deve ao fato de O Hobbit ser um épico grandioso e sério.

Por fim, mesmo sendo um filme que não me agradou, é ótimo ver que estamos diante de mais uma revolução  tecnológica na História do Cinema, e em menos de 4 anos após a vinda de Avatar: os 48 quadros por segundo. É absurdamente lindo e impressionante ter uma espécie de quadro na parede do cinema, onde tudo se assemelha à realidade. A nitidez é embasbacante e o 3D se torna quase natural aos olhos. Esse, pra mim, é o grande destaque de O Hobbit: ele dividiu o cinema em antes de depois. A tendência é que os 48 fps cheguem pra ficar, pois trazem uma qualidade nunca antes vista, embora ainda necessite de alguns ajustes (há momentos no filme em que tudo parece estar em câmera acelerada). Saldo: O Hobbit não é um filme ruim. Ele funciona como filme e deverá agradar a muita gente. Mas esse "agradar", na verdade, é apenas uma repetição daquilo que já foi feito 10 anos atrás em termos de narrativa e até mesmo de enquadramentos. Nesse ponto, preciso me desculpar um pouco com o Christopher Nolan quando escrevi a impressão do filme novo do Batman: ao menos, Nolan só copiou a mesma história do primeiro filme - Peter Jackson copiou o filme todo.

Alex Martire






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+ comentários + 2 comentários

26 de dezembro de 2012 às 17:18

Perfeito, Alex. Achei tudo isso também. Tudo bem, sabe, reaproveitar trilha sonora, figurino, locação, programinha de computador, tudo... mas não precisava refazer aquilo que já foi tão lindo há 10 anos atrás. Dá uma sensação de requentado.

Eu gostei, achei bonito, mas longe de ser aquilo que poderia ser. Podia ficar em um filme, ou até dois, vai saber. Não precisava ser trilogia, não precisava ser épico e, definitivamente, não precisava ser tão sério. Eu morri de medo quando soube que o del Toro seria o diretor, porque pensei no Labirinto do Fauno e fiquei apavorada de ele transformar O Hobbit numa fábula medonha. Não sei se é 'culpa' dele, que prossegue no roteiro, mas acho que tirar toda a leveza e fofurice d'O Hobbit foi mancada dessa gente.

Enfim, eu mudei de opinião 37 vezes no cinema, e saí mais feliz do que o contrário. Mas sei que se ficar pensando e analisando, o filme vai afundar. Então, deixa como está. Provavelmente ele não virará um 'filme de cabeceira' que nem o SdA, que eu assisto uma ou duas vezes por ano inteiro. E choro. Sempre.

27 de dezembro de 2012 às 07:21

Então seremos apedrejados publicamente juntos! \o/

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