A Hora Mais Escura, 2012.


Kathryn Bigelow é uma diretora que adora tiros, mesmo sabendo que alguns podem, eventualmente, acertar o próprio pé. Não digo isso pelo seu mais recente filme em si, A Hora Mais Escura, mas pelo o que ele pode repercutir. Trata-se do episódio mais estranho e mal contado da história militar recente estadunidense: a caçada a Osama Bin Laden, que supostamente terminou com sua morte no dia 1º de Maio de 2011. A diretora não tinha em mente fazer um filme que mostrasse a morte de Bin Laden quando começou a preparar o projeto: era apenas um filme sobre a busca ao famoso terrorista, que muito provavelmente acabaria com aqueles letreiros dizendo "Osama Bin Laden continua a ser o inimigo número 1 dos EUA e blá, blá, blá". Para a sorte da diretora, meteram algumas balas no Osama e tudo teve de ser refeito desde o começo. Desse modo, Bigelow agora se torna a responsável por transmitir ao resto do mundo a versão oficial sobre a morte de Bin Laden em 2011. Uma versão que tem trazido problemas para os envolvidos no filme: problemas que não estão atrás das câmeras, mas, sim, fora dos estúdios - Bigelow mostra prisioneiros sendo torturados no Paquistão e Afeganistão, enquanto a CIA diz que isso nunca aconteceu; para piorar, o roteirista Mark Boal está com a corda no pescoço: as autoridades políticas e militares dos EUA querem que ele explique como conseguiu as supostas informações para escrever a história - Mark pode dizer que existe liberdade de informação e se negar a explicar, contudo, corre o risco de ir pra cadeia. Enfim, há muita coisa envolvida nessa obra de Kathryn Bigelow e que, só por isso, já vale a pena conferir.

Mesmo sendo um filme mais longo e com um orçamento maior do que a sua película anterior, Kathryn Bigelow fez uma obra que, para mim, é inferior ao excelente Guerra ao Terror, de 2008 (que muitos ainda hoje dizem que não mereceu ganhar o Oscar de Melhor Filme; eu discordo). Digo isso porque talvez falte algo essencial a filmes de guerra: as cenas de batalha. A Hora Mais Escura é uma obra bastante política e administrativa, digamos - a maior parte da ação se passa entre os escritórios da CIA e os presídios paquistaneses e afegãos. Falta guerra? Sim, falta; mas isso não diminui o interesse pelo filme. A história pode ser contada em uma frase: enquanto interrogam prisioneiros para se chegar a um dos braços direitos de Osama Bin Laden, Abu Ahmed, a agente da CIA Maya (Jessica Chastain) acaba por descobrir o provável esconderijo de Bin Laden, no Paquistão. A partir daí, todos sabemos o que ocorreu.

Confesso que A Hora Mais Escura me deixou um tanto confuso. Não pelo roteiro em si, que é bastante claro, mas pelas intenções da diretora. Alguns momentos eu pensava que o filme é bem ufanista; em outros, achava que, na verdade, a obra é bastante crítica às ações tomadas pelos estadunidenses durante a "caçada". Enfim, prefiro achar que esse é um mérito de Bigelow: saber dosar as coisas e dar abertura para várias interpretações. Acho que, na verdade, há mais "contras" às decisões/ações dos EUA do que "prós". O filme começa com o interrogatório extremamente violento fisicamente e psicologicamente ao detento Ammar: além de ser "afogado", ele fica nu e é tratado como um cachorro, sendo puxado pela corrente pelo agente Dan (Jason Clarke). Há outras cenas de tortura nos interrogatórios e nunca há um questionamento por parte dos torturadores se isso está correto ou não: a única coisa contrária a isso é o discurso de Barack Obama na TV, dizendo que os EUA nunca usaram meios violentos para conseguir informações (estranhamente, as cenas de tortura somem do filme após esse discurso). Há também um comportamento que pode ser interpretado tanto como algo bem "americano" quanto uma crítica feroz aos ideais estadunidenses: Maya em certo momento diz: "Eu vou matar Bin Laden". Não há, em nenhum momento do filme, a ideia de sequer julgar Bin Laden: ele precisa ser morto e todos estão de acordo. 

Isso fica claramente refletido na excelente cena final: durando o mesmo tempo que a operação verdadeira teve (mais ou menos 25 minutos), Bigelow vai filmar a entrada do grupo de elite do exército na casa onde Bin Laden estava hospedado. É a parte mais tensa da obra e é a que todos nós estávamos esperando, afinal. Os soldados estadunidenses não cogitaram prender Osama, eles simplesmente foram lá para matá-lo. Mais do que isso: mataram todos os homens que estavam na casa, na frente de seus filhos e esposas (e mataram uma mulher também), sendo que apenas um dos homens atirou: covardia extrema. A parte que mais me deixou curioso, contudo, é a da morte do Bin Laden em si. Vejamos: o exército chega de helicóptero no seu quintal, os soldados explodem várias portas para conseguir entrar na sua casa, eles matam todos os homens que estavam no primeiro e segundo andares, e você, que estava no terceiro andar, não consegue ouvir nada?! Só posso acreditar que Bin Laden tinha o sono muito pesado, pois quando os soldados chegam no terceiro andar não são recebidos a balas, mas está um silêncio enorme. Para piorar - vejam se concordam comigo o quão isso é ridículo - um soldado americano fica sussurrando no corredor "Osama, Osama", e o Bin Laden abre a porta e leva os tiros! Tem de ser muito idiota pra fazer isso, não?! Ele nem estava armado: o filme mostra que seu fuzil estava sobre a cama, pendurado. Se foi assim que realmente aconteceu, foi uma das mortes mais esdrúxulas já ocorridas.

Bom, Kathryn Bigelow fez um trabalho muito bom em A Hora Mais Escura, mas que não supera seu filme anterior. Como eu disse, ela representou muito bem na telona a história oficial sobre a morte de Osama Bin Laden. Mas essa é a versão estadunidense. Certamente muitas pessoas irão tomar o filme como algo verídico, quase uma encenação fidedigna da morte de um dos homens mais procurados do mundo. Nesse ponto, Bigelow presta um grande serviço aos EUA, dando explicações e tornando tudo mais claro. Porém, a pergunta que resta é: Osama Bin Laden realmente foi morto? Ele realmente estava naquela casa? Realmente jogaram o seu corpo no mar, ao invés de transformar num "julgamento do século", enforcando-o e  condenando vídeos que "misteriosamente" foram parar na internet mostrando sua morte?

É pra se pensar. 

(PS: Jessica Chastain está incrível no papel de Maya. Mereceu a indicação ao Globo de Ouro e, com certeza, merecerá a indicação ao Oscar.)

Alex Martire




O vídeo do pronunciamento de Obama sobre a morte de Bin Laden:



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+ comentários + 2 comentários

10 de janeiro de 2013 às 03:00

quero ver só por causa daquela entrevista com sei lá quem da CIA que disse que pra dar uma 'simples bofetada' precisa de autorização.

é tipo a PM de SP!!!

3 de fevereiro de 2013 às 03:23

bah, levei quase um mês pra assistir esse filme! até agora não sei se achei ruim, ou uma porcaria. não consigo pensar se há algo minimamente gostável nesse filme, que conseguiu sim me deixar tensa e histérica na parte final, mas me fez dormir doze vezes antes...

É com muita dor no coração que digo que Jessica Chastain foi a PIOR escolha pro papel. ela é muito lindinha, fofinha e etérea demais pra passar credibilidade como a 'motherfucker' que achou o cara. não convence, não tá bem, apenas irritante.

triste, viu. triste!

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