Cimarron, 1931.


O poster desse filme é bastante épico, ainda mais remetendo à Criação bíblica, como se o destino de alguns homens fosse ser o pioneirismo em algumas áreas. Contudo, Cimarron não se limita ao épico apenas na imagem que foi afixada nos cinemas quando lançado: o filme narra uma jornada de 40 anos, mostrando como os estadunidenses fizeram sua corrida para tomar posse das antigas terras indígenas Osage e Cherokee. Grandiosa, a obra foi dirigida por Wesley Ruggles e recebeu o prêmio de Melhor Filme no Oscar de 1931.Essa foi a primeira vez que um filme com elementos de Western recebeu tal honraria.

Acho que o grande problema do filme para quem não conhece um pouco mais da história dos EUA é o título. À primeira vista, parece ser um nome próprio, talvez do protagonista masculino principal da narrativa. Mas o filme termina e só em um momento o termo "cimarron" aparece, e é pejorativo (ao menos, foi o que entendi). Isso leva os mais curiosos a procurarem um pouco sobre esse nome e, ao fazerem isso, vão se deparar com algo que não é tão simples de se entender, tornando-se um tanto confuso: Cimarron era o nome dado aos territórios dos índios cherokee após a Guerra da Secessão e que foram ocupados, primeiramente, por vaqueiros em busca de territórios para pecuária. Porém, com o passar do tempo, começou a haver regulamentações e leis feitas por e para esses moradores, levando a uma distinção clara entre os que pertenciam à cultura estadunidense e aos que tinham tradições indígenas. Desse modo, havia, sim, uma fronteira que separava territórios de diferentes culturas, mas ela era tênue e, em 1889, o presidente Benjamim Harrison deu carta branca aos estadunidenses para invadirem as reservas indígenas e estabelecerem assentamentos nelas.

Cimarron começa justamente nesse momento. Os documentos apontam para 50.000 cidadãos estadunidenses adentrando o território de Oklahoma em 1889 em uma corrida por terras. E quando digo "corrida", quero dizer literalmente uma corrida: a primeira cena do filme é embasbacante quando levamos em consideração que tudo em 1930/1931 era feito com pessoas de verdade, figurantes, sem uso de computação gráfica - são vários minutos de carroças, cavalos e bicicletas (!) cruzando o território em desabalada carreira, com tomadas bem amplas e um ou outro contra-plongée mostrando detalhes das rodas das carroças. Logo após somos apresentados aos personagens principais e o filme começa a tomar forma: Yancey Cravat (Richard Dix) é casado com Sabra Cravat (Irene Dunne) - com quem tem o pequeno Cim - e mora em Wichita (Kansas). A família de Sabra desaprova o casamento pelo fato de Yancey ser um homem de alma livre, um aventureiro, mas esse é um dos motivos que fazem a jovem amar o marido. Participando da corrida por terras de 1889, Yancey consegue um lote na terra dos índios osange e estabelece moradia lá com sua família. Ele também é editor de jornal e em pouco tempo funda o Oklahoma Wigwam, periódico que logo alcança significante reconhecimento e faz com que Yancey torne-se uma figura pública na cidade, participando de cultos religiosos e ajudando a defender o local de grupos de bandidos. É esse espírito pioneiro e corajoso de Yancey que serve de guia para todo o resto do filme. Mostrando a virada do século como algo sempre evolutivo, a obra dirigida por Ruggles serve de propaganda para o contexto difícil que os EUA atravessavam durante a produção do filme: a Grande Depressão.

Yancey Cravat nunca se prende a um lugar, está sempre em busca de novas aventuras e parte por longos anos em busca de novos territórios para conquistar quando o governo estadunidense começa a preparar outras corridas por terras. Em seu lugar na preparação do jornal fica sua esposa Sabra, que também é um retrato da mulher que, embora nunca podendo botar freios em seu marido, torna-se empreendedora e condutora dos afazeres do esposo enquanto ele não volta: Sabra seria muito bem uma mulher independente se os padrões da época assim permitissem. Em outras palavras, Cimarron foi filmado tendo por base o famoso livro homônimo redigido por Edna Ferber em 1929 e mostra - ou tenta mostrar - para as plateias que iam ao cinema na época como é possível superar problemas que surgem ao longo dos anos: problemas políticos e econômicos. O filme (e o livro), então, seria um meio de inspirar as pessoas a vencerem a Depressão que se arrastava desde 1929.

Mesmo tendo, num momento ou outro, alguns discursos pró-indígenas por parte de Yancey Cravat, Cimarron é claramente uma obra estadunidense que se baseia na desapropriação de terras e deculturação indígenas. É errado fazer o que fizeram aos índios? Sim, como o próprio Yancey admite. Porém, ele mesmo parte em busca de novos territórios e luta contra os espanhóis para conquistar mais lugares no Oeste. No discurso jornalístico, tudo é muito bonito. Mas dificilmente Yancey ganharia uma estátua em Oklahoma se tivesse, de fato, lutado pelos direitos indígenas e, principalmente, vencido.

O filme em si é bastante agradável de se ver. Mesmo tendo envelhecido muito com o tempo e não ser mais tão atual, quando temos em mente os contextos históricos nos quais a obra se passa (afinal, ela começa em 1889 e termina em 1930!) ela se torna muito mais atraente. Vale a pena assistir mesmo não sendo um dos melhores filmes já feitos. Ainda mais por ter sido o primeiro filme a ser indicado nas 5 categorias principais do Oscar na época: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz, Melhor Ator e Melhor Roteiro.

Alex Martire




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