Cisne Negro, 2010.



(Originalmente escrito em 2010)

Aronofsky fez 5 longas até hoje; três excelentes - "Pi", "Réquiem para um Sonho", "Fonte da Vida" - e dois espetaculares: "O Lutador" e "Cisne Negro". Em cinco filmes ele já conseguiu deixar sua marca, aquela coisa que assistimos e dizemos: "Pô, isso é do Aronofsky".

"Cisne Negro" é, antes de mais nada, uma fábula moderna de Dr. Jekyll and Mr. Hyde, do Robert Louis Stevenson. E é um filme sobre bailarinas.


A partir daqui fica um pouco difícil eu falar qualquer coisa sobre o filme com imparcialidade, uma vez que conheço - pouco, é bem verdade - algumas coisas sobre o mundo do balé: a vantagem de ter uma pessoa querida, uma bailarina entre meus contatos de vida.

Tudo gira em torno de Nina, a bailarina interpretada por Natalie "Minha Musa" Portman. Essa talvez seja a grande semelhança com "O Lutador": temos a visão de uma vida apenas, a da personagem principal. E o diretor usa direto o tipo de filmagem que nos deixa bem à vontade: caminhamos atrás dos personagens, espiamos sobre seus ombros. Pode parecer simples isso, mas a coisa é tão bem executada que podemos sentir a emoção das pessoas (a cena de Mickey Rourke entrando no balcão de frios em "O Lutador" talvez seja o grande exemplo - seu passado fica conosco enquanto ele segue seu caminho). Aronofsky trabalha o lado humano das bailarinas. Sempre há um mistério sobre essas mulheres, algo que beira ao fetiche (para nós, homens, creio), e Aronofsky faz questão de mostrar que são seres comuns, com problemas familiares e de auto-confiança. E, sim, ele também deixa claro que os pés das bailarinas são calejados e "feios": fruto de horas e horas de trabalho.

São muitas sutilezas. Algumas só serão compreendidas por quem conhece um pouco da coisa, tal como os nomes franceses dos movimentos e referências ao mundo do balé. Outros pormenores são lindíssimos. Mas lindíssimos mesmo! Há algo extremamente delicado nesse filme, que adorei: a respiração das bailarinas. Já tive a honra, o prazer de ter trabalhado uns dias com minha amiga bailarina há uns anos e pude ver como a coisa funciona: são  respirações curtinhas que mal mexem o peito; é um arfar que ajuda a manter o equilíbrio e o pescoço reto. Na verdade, não sei explicar direito, mas é algo muito apaixonante para quem vê: é de uma delicadeza fantástica e de um prazer auditivo imenso ouvir o chiado que sai de suas bocas. O filme, por sinal, abusa de coisas simples e talvez não despertem muito a atenção em cena: mas nisso está o encanto: é tudo tão normal, tão parecido com o nosso cotidiano, que deixamos "passar em branco". 

Porém, Nina não é simples. Ela é a graça do filme. Não importa o que seja preciso para se conseguir o papel de Rainha no Lago dos Cisnes: ela fará. Há sofrimento, claro. E a descoberta de um papel tão difícil é, ao mesmo tempo, a (re)descoberta de seu próprio corpo. É um filme também focado no sexo, com uma cena "forte", mas não é apelativo: quem assiste entende que Nina simplesmente precisa daquilo. Aronofsky consegue fazer com que a gente se apaixone por Nina. É impossível não ser assim. E não digo só sobre a beleza (afinal, quase toda bailarina é linda), mas o jeito de falar e sonhar. O filme é, também, a história de um sonho: que perturba, mas pode ser alcançado. 

Enfim, é um filme sobre o mundo-cão do balé. Das bailarinas. Curiosamente, esse filme foi sido assistido mais por mulheres do que homens lá nos EUA. Talvez porque lide com a dança e fale sobre amor? Não sei explicar. Mas não é um filme feminino. Não é um filme masculino, tampouco. É um filme sensível, que se desenrola como se estivéssemos deslizando os dedos pelas pernas das bailarinas. Natalie Portman tem o melhor papel de sua vida nesse filme. E Aronofsky tem o seu melhor filme.  Acompanhei ansiosamente a produção do filme desde que foi anunciado. Saíram várias notícias sobre ele, críticas dizendo que é um dos melhores filmes de 2010. Concordo e discordo ao mesmo tempo: é, sim, um dos melhores filmes que já vi - e terei visto -  na vida. 

Acho que me identifiquei muito com o filme pelas questões pessoais que descrevi acima. Mas esperei algumas horas passarem para escrever isso sem estar "embriagado" pela maravilha que assisti. Mesmo após horas, o impacto continua: Aronofsky é, sim, um dos novos deuses do cinema. 

Alex Martire

A vida é assim, alegre e triste ao mesmo tempo. Aronofsky acabou de provar isso.
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